sexta-feira, 11 de maio de 2012

A Geração do Petróleo

Recém-saídos das universidades, jovens especialistas na exploração do chamado ouro negro são disputados pelas principais multinacionais do setor e remunerados com salário de gente grande


Marina Salomão, 22 anos - Contratada há menos de um mês por uma multinacional francesa, a praticante de muay thai se prepara para realizar um estágio no exterior

Dona de uma rotina pouco usual para uma moça de sua idade, a jovem Flávia Amaral, 24 anos, está acostumada a lidar com desafios. Sua jornada de trabalho começa com uma viagem de 150 quilômetros do Rio a Cabo Frio e, a partir dali, um voo de helicóptero por cerca de meia hora mar adentro, até as plataformas instaladas a cerca de 100 quilômetros da costa fluminense. Uma vez embarcada, passa catorze dias seguidos na estrutura, onde realiza tarefas complexas e perigosas, como conferir as medidas de dutos de bombeamento. Um pequeno erro nos cálculos pode ser fatal e provocar prejuízos na casa de sete dígitos.
 A pressão, a distância de casa, o confinamento em cubículos e a obrigação de passar metade do mês no meio do oceano fazem parte da carreira que escolheu. Mesmo assim, Flávia adora o que faz. Com apenas um ano de formada no curso de engenharia de petróleo, ela ocupa o posto de especialista em perfuração da companhia dinamarquesa Maersk Oil, uma das potências do setor. Antes disso, quando ainda estava na faculdade, no câmpus da PUC, foi contratada pela anglo-holandesa Royal Dutch Shell, outro gigante da área. Reservada, ela não gosta de falar em dinheiro, mas, tomando como base seu cargo e  o competitivo mercado em que atua, a moça ganha hoje aproximadamente 10 000 reais por mês. “Não é um emprego fácil, mas tem grandes compensações”, diz.

Bem-sucedida, com ótimo salário e disputada pelas empresas, Flávia é o retrato de uma geração abençoada: os garotos do petróleo. Trata-se de uma turma que escolheu a profissão certa no momento perfeito. Mal recebem o diploma, eles já têm emprego garantido em posições que pagam até 7 500 reais mensais — na mesma fase, um advogado recebe a metade disso e um jornalista, cerca de um terço. Os primeiros representantes dessa leva começaram a despontar nos últimos cinco anos, quando surgiu o primeiro curso de graduação específico para a área, ministrado pela Universidade Estadual do Norte Fluminense. Atualmente, dezesseis instituições de ensino superior oferecem a carreira por aqui. A razão da multiplicação, em um período relativamente curto, é óbvia. Com um quinto das reservas nacionais e 85% da produção do país, o Rio de Janeiro transformou-se em uma espécie de Houston brasileira. Hoje, a atividade responde por 20% do PIB fluminense, um porcentual que deve chegar a 30% nos próximos dez anos. Tudo isso sem contar o potencial do pré-sal. Diz o economista Fernando Blumenschein, da FGV, autor de um recente estudo sobre o tema: “Nesse caso, poderíamos chegar ao dobro do volume atual”.

Histórias de jovens que experimentam um repentino sucesso profissional e financeiro não são novidade por aqui. De tempos em tempos, surgem carreiras que possibilitam essa ascensão. Nos anos 90, por exemplo, ganhou notoriedade no Rio uma geração de profissionais que recebia fortunas trabalhando em bancos de investimentos. Famosos por seus gastos espetaculares, especialmente em vinhos raros e casas no exterior, eles agiam (e ainda agem) como uma tribo. Vestidos com calça cáqui, camisa social azul, dirigindo carro da marca sueca Volvo e praticando esportes religiosamente, os garotos imitavam os códigos e os rituais ditados pelos caciques do mercado. A turma do petróleo é uma versão menos empolada disso. Eles não ganham tanto nem cultivam hábitos tão caros e de ostentação. Mas gostam de viver bem. Aluno da primeira turma formada pela UFRJ, Bernardo Pestana, 25 anos, é um típico representante. Em 2008, ele entrou na OGX, de Eike Batista, como estagiário. Hoje é um dos responsáveis pela coordenação de perfurações da empresa. Discreto, não fala quanto recebe, mas para funcionários do seu nível a companhia paga pelo menos 10 000 reais por mês (fora bônus e gratificações). É o suficiente para alimentar um sonho pouco comum para alguém tão novo. Nas próximas semanas, Bernardo vai começar a investir em cavalos de corrida. Ele está prestes a comprar seus dois primeiros, por 20 000 reais cada um. Sua meta é ambiciosa. “Quero ter um haras com pelo menos 100 animais, não importa o tempo que isso demore.”
 
João Magalhães 24 anos - Formado em julho, foi logo contratado e enviado para um curso nos Estados Unidos. Agora, acaba de comprar seu primeiro carro
Um dado crucial sobre os jovens da nova geração é que eles construíram a carreira ao largo da Petrobras. A maioria atua em empresas privadas, multinacionais, que oferecem oportunidades de crescimento mais rápido e possibilidade de transferências para o exterior. Hoje existem 54 companhias petrolíferas instaladas no Rio, 39 delas estrangeiras. Contratada pela francesa Schlumberger há cerca de um mês, Marina Salomão, 22 anos, formou-se em dezembro, com uma festa regada a tequila na boate 00, na Gávea, para a família e os amigos. Sua turma era composta de apenas seis pessoas — todas já estão empregadas. Marina, por exemplo, está prestes a embarcar para uma temporada de treinamento lá fora. A empresa não definiu o destino, mas as opções são Estados Unidos, Emirados Árabes ou Rússia. Nem tudo é glamour, claro. Para conquistar a vaga, ela mudou-se para Macaé, no litoral fluminense, e vive provisoriamente em um hotel. Mas a vida numa estatal, de fato, não combinaria com os anseios da moça. Como outros de sua estirpe, ela não esconde características como ambição, pragmatismo e espírito competitivo. “Eu nunca me imaginei trabalhando a vida inteira no mesmo lugar. Acho que temos de buscar sempre as melhores oportunidades”, diz.

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